Mosaico de foto de Débora Fontenelle na Califórnia

UMA CARIOCA EM TERRAS CALIFORNIANAS

Viajar. Amo viajar. Embora minhas viagens não sejam tão frequentes quanto eu gostaria, toda a vez que eu arrumo a mala e me lembro que por alguns dias ficarei apreciando novas paisagens, culturas e sabores, já entro no ritmo da alegria. Só de pensar que vou andar por mais um pedaço deste mundo e desfrutar de momentos livres dos compromissos diários, a satisfação é imensa… E a minha mais recente aventura como turista não fugiu a esta prazerosa regra. Fui à Califórnia para rever uma querida amiga e passei duas semanas que, de tão surpreendentes, se tornaram atípicas. Não houve dia em que eu não me tenha impressionado de modo positivo com as cidades que visitei. E garanto, a viagem superou todas as minhas expectativas e minha visão dos Estados Unidos nunca mais será a mesma. Como quinze dias puderam causar tamanho impacto? Até eu pretendo desvendar esse mistério nas próximas linhas…

No meu imaginário, toda vez que falavam em Califórnia, eu logo visualizava cenas de praias, surfistas pegando onda e filmes de Hollywood. Lembrava-me também da famosa “corrida do ouro” do século XIX e do fato que, se fosse uma nação independente, este estado norte-americano ocuparia a 6ª posição no atual ranking das maiores economias do mundo*. E com tantas boas referências, como é que só este ano decidi economizar para fazer um passeio por lá? Questionamentos à parte, admito que o cotidiano da minha cidade contribuiu muito para a mudança de planos. Por exemplo, no Centro do Rio de Janeiro em dias de ato político, ouvir bombas, rojões, tiros de bala de borracha e ver passeatas seguidas de saques, depredações e conflitos com policiais, já são consideradas atividades locais. E para quem, como eu, trabalha na região próxima a Cinelândia, Largo da Carioca e Assembleia Legislativa pode dizer que se sente praticamente “no olho do furacão”. Como veem, o Centro do Rio é também o Centro das Emoções. Apesar do meu amor pelo Rio de Janeiro, eu estava ávida para tirar férias e viajar para um lugar bem distante dessas e de outras turbulências. Há tempos também eu queria rever a Lígia, amiga de longuíssima data, que reside na pacata Simi Valley, Califórnia. Então, falei com ela e resolvi ir para os States. Pesquisei alguns roteiros, mas sem vasculhar muito para não chegar lá com qualquer sensação de “déjà-vu”.  E assim fui, sem saber muito o que me esperava, mas por vários motivos pessoais, com a certeza de que realmente valeria a pena.

Cheguei a Los Angeles em um dia ensolarado e lá estavam a Lígia e o seu marido James para recepcionar-me. Eu não os via há mais de dez anos, e então fiquei numa felicidade só! Entrei na pick-up deles e pelo caminho passei a contemplar as formações rochosas e a singular vegetação da região dos vales depois que deixamos os muitos prédios de L.A. para trás. E à medida que chegávamos a Simi apareciam no cenário belas residências com jardins para deleitar a minha vista. Logo na chegada, deparei-me com um cenário de filme: a rua era toda composta por casas lindas e espaçosas como na série “Desperate Housewives”! E não era só a rua dela, mas praticamente todas daquela cidade e das vizinhas como comprovei dias depois. Além de Simi Valley, pude ver tanto em Filmore, Moorpark, Northridge e Thousand Oaks que, de um modo geral, as casas eram bem amplas (várias de dois andares) sempre com jardins, rodeadas por árvores como pinheiros e palmeiras, ambiente adequado para visitantes do reino animal como o beija-flor, esquilos e até coelhinhos cinzentos que podiam ser vistos correndo pelos gramados.

Amei cada vez que eu pude dar uma caminhada pelo bairro onde me hospedei. Que grande prazer eu tive em poder pisar em calçadas tão bem-cuidadas, limpas, planas, sem rachaduras, buracos ou obstáculos a desviar! E também de andar em uma lugar onde o pedestre é que tem prioridade e os carros param para as pessoas passarem. Aliás, isto ocorre em cidades em que o automóvel particular é o meio principal de transporte, pois lá se você não possui um carro, tem boas chances de não sair do lugar. E quanto à segurança? Era tão grande que só havia experimentado tal sensação no Brasil quando andei sozinha pelas ruas de Gramado/RS. E por falar em sair sozinha, um dia aventurei-me a andar pelas ruas só com a minha câmera como companheira. Fiquei tão animada em tirar as fotos pela vizinhança que saí sem dinheiro, celular e até documentos… Uma coisa que até que aquele momento era inimaginável para mim, ainda mais estando em uma terra estrangeira! Mas, afinal, o que uma paisagem encantadora não nos faz?

Saí e fiquei muito agradecida a Deus por estar desbravando aquelas ruas da América Norte como jamais pensara antes. Andei, olhei e fotografei cada imagem que se sobressaltava aos meus olhos. Observei que cada residência tinha janelas sem grades, chaminé no topo, uma cerquinha ou muro baixo (outras nem isso!), garagem com espaço para dois ou três carros e muitas contavam na entrada com uma cesta de basquete, trailer estacionado e uma bandeira americana a tremular.

Assim eu pude admirar as flores ao longo das ruas, tocar folhas de diferentes árvores, sentir o clima quente e seco na pele e saber que havia ainda muito o que contemplar… O calor era intenso e a forte luminosidade contribuiu para que cada foto captasse o cenário com nitidez. E enquanto eu caminhava, passava por tradicionais caixas de correio e latões de lixo pretos, verdes e azuis – tão vistosos que nem refletiam seu conteúdo –  até que parei numa área de nome Indian Meadows, onde havia alguns bancos para sentar. Ali parei um pouco e vi uma caixa com saquinhos de emergência para cães, caso os bichos resolvessem fazer qualquer necessidade básica. Tudo era cuidadosamente planejado para evitar imprevistos e manter a região com toda a limpeza. Parecia até que eu estava em outro mundo…

E como nada é perfeito, o sol não dava trégua e antes de fotografar, eu tinha sempre que observar se havia alguém nas janelas, principalmente depois de perceber que andava “sem lenço e sem documento.*” A situação ainda piorou quando avistei uma placa que dizia mais ou menos assim: “Há câmeras em toda a região. Caso notem algum indivíduo em atitude suspeita, reportem à polícia imediatamente.” Pensei: “Pôxa, sou brasileira, tirando foto de propriedades privadas americanas; ninguém aqui me conhece e estou sem passaporte. Se alguém me achar suspeita, estou ferrada.” Senti o susto, mas não deixei de voltar cheia de boas fotos comigo. Podem até pensar que estou exagerando, mas saibam que, em outra ocasião, eu e a minha amiga fomos abordadas por um funcionário de um centro cultural indagando porque estávamos fotografando. Depois de explicar que eu era turista e, como tínhamos chegado antes da hora da abertura do local, decidimos tirar umas fotos, fomos liberadas… É, segurança lá é coisa séria. Por mim, estava tudo bem e nada tenho a reclamar. Não me canso de pensar como todos os lugares poderiam ser belos e organizados assim!

A Califórnia, no entanto, era muito mais do que casas bonitas e ruas bem-cuidadas. Por onde passei, vi que o capricho era a ordem do dia. Os mercados, farmácias, lojas, restaurantes e igrejas seguiam o mesmo padrão de qualidade, limpeza e organização. As pessoas em geral eram educadas e simpáticas, incluindo vendedores e atendentes. O respeito ao próximo parecia uma característica já enraizada na sociedade e contribuía muito para garantir o bom funcionamento do sistema. Ah, a Califórnia me proporcionou passeios inesquecíveis! Na volta ao Rio, soube que, quando uma amiga perguntou por mim no trabalho, um colega respondeu que eu estava em pleno “Californian Dream” (Sonho Californiano). Vejo mesmo que ele tinha razão. Mas, o melhor da história é que o sonho não parou por aí. E tenham a certeza de que tão cedo não tem como parar… Aguardem-me!

*Obs.1: Segundo dados oficiais divulgados pelo Escritório de Análise Econômica dos Estados Unidos (Bureau of  Economic Analysis) em 2016. 

*Obs2: Alusão a trecho da música “Alegria, alegria” de Caetano Veloso. (1968)


Comentários

Participe! Deixe seu comentário