Hoje em dia, mais do que em qualquer outra época, tenho ouvido falar sobre a importância da participação da mulher na política brasileira. É só observar qualquer propaganda eleitoral gratuita para ver candidatas pertencentes a uma ala feminina dentro da legenda a clamar pelos direitos das mulheres. Há atualmente até o Partido da Mulher Brasileira (PMB). Mas, como falar da mulher na política sem mencionar as primeiras mulheres a governar este país com seus feitos e efeitos históricos? Por isso, neste texto, faço questão de destacá-las: A Imperatriz Leopoldina e a Princesa Isabel. Isto mesmo! No Brasil do século XIX houve mulheres que chegaram a comandar e… com impacto!
No curto período em que puderam participar do poder central, tanto a Imperatriz Leopoldina como a Princesa Isabel tomaram decisões audaciosas que mudariam o curso da nossa História definitivamente. A começar por Leopoldina (1797-1826) que foi a responsável pela assinatura oficial da Declaração de Independência. Ao contrário do que eu pensava (há até pouco tempo), o documento não foi assinado por Dom Pedro I, mas por sua esposa em 2 de setembro de 1822 quando, na condição de regente, presidiu o Conselho de Estado formado exclusivamente por homens. Só por isso, Leopoldina merecia ser muito mais homenageada. D. Pedro somente recebeu a correspondência em São Paulo com a informação em 7 de setembro de 1822 e, então, proclamou a independência às margens do Rio Ipiranga. A nova data passou para a História como a oficial e o papel de liderança de Leopoldina foi ofuscado. No século XXI, a importância da Imperatriz parece estar sendo resgatada, sobretudo após o lançamento de dois livros a seu respeito: “A Biografia Íntima de Leopoldina” (2015) de Marsílio Cassotti e “D. Leopoldina. A História não Contada”. A Mulher que Arquitetou a Independência do Brasil” (2017) de Paulo Rezzutti. Ambos receberam muitos elogios tanto de críticos como de leitores.
Além de defender o Brasil independente, a Imperatriz contribuiu positivamente para o nosso país em outros momentos. Segundo Rezzutti, em declaração publicada no site da BBC Brasil em 10 de dezembro de 2017: “Em 1822, D. Leopoldina desrespeitou as ordens das cortes constitucionais portuguesas e declarou o ‘Fico’ antes de D. Pedro, com uma visão muito mais astuta que o marido…” Diante da situação, Dom Pedro concordou em não deixar o país por pressão dos portugueses – como fizera D. João VI – e declarou publicamente sua decisão no Paço Imperial, consagrando a data de 9 de janeiro de 1822 como o “Dia do Fico”. Leopoldina demonstrava tanto perspicácia política como amor pelo Brasil, e com isso, recebia a admiração do povo e de homens influentes no governo como José Bonifácio, ninguém menos que o braço direito de D. Pedro na época. Com certeza, não faltam episódios interessantes na vida dessa nobre austríaca que veio para o Brasil em 1817 para conhecer o esposo e residir nesta terra vista por seus contemporâneos europeus como uma espécie de paraíso tropical.
Lembro-me que em 2007 eu tive o prazer de ir à Caixa Cultural do Rio de Janeiro para ver a exposição de Thomas Ender, o pintor oficial da 1ª expedição científica a chegar ao Brasil e que, não por acaso, veio com a comitiva da então Princesa Leopoldina. Ela, como apaixonada por ciências naturais, teve a grande iniciativa de trazer estudiosos austríacos para pesquisar nossa natureza. Leopoldina também mostrou ser uma mulher de visão e opinião fortes: era contra a escravidão e incentivou a imigração europeia como a vinda de suíços a Nova Friburgo/RJ e de alemães ao Rio Grande do Sul. E, para resumir os feitos de Leopoldina, só digo mais uma coisa, ou melhor, duas: ela contribuiu para a criação da bandeira imperial após a Independência, pois sugeriu o verde para representar a casa de Bragança (família de D. Pedro) e o amarelo para a casa de Habsburgo (sua própria família); além disso, regeu o Brasil simplesmente três vezes (!) na sua breve vida que terminaria aos 29 anos de idade. E pensar que, na maioria das vezes, referem-se a Leopoldina apenas pelas traições sofridas pelo marido… Com mais justiça, lembram-se dela também como mãe de nosso imperador Dom Pedro II, o primeiro monarca nascido em solo brasileiro. No meu caso, quanto mais leio sobre a Imperatriz, mais eu me interesso por sua trajetória e me estimulo a ler sobre outras mulheres que souberam honrar sua posição na História.
A Princesa Isabel (1846-1921), por sua vez, tornou-se muito popular por ter assinado a Lei Áurea em 1888 e libertado todos os negros no Brasil da escravidão. Era um desejo do coração de D. Pedro II que, por fim, se concretizou pelas mãos da filha. Este feito chegou a receber a aclamação de milhares de pessoas nas ruas do Rio e a tornou conhecida como “A Redentora”. Segundo as palavras do historiador José Murilo de Carvalho em seu livro “D. Pedro II” (2007): “Isabel fora aplaudida delirantemente por ocasião da assinatura da Lei Áurea. Por vários dias, a cidade celebrou o evento.” Outro privilégio que eu tive foi este: ver o documento bem de perto em exposição na Biblioteca Nacional! Mas, muito antes da Lei Áurea, em 1871, a princesa já havia assinado uma lei antiescravagista de destaque: “A Lei do Ventre Livre” que libertava todos os nascidos de escravas no país a partir daquela data. A Princesa Isabel, por ser totalmente a favor da abolição da escravatura, marcou suas regências com leis libertárias. Suas atitudes, inclusive, foram coerentes com suas convicções cristãs, pois ela via todos os homens como livres. Pouco tempo de assinar a Lei Áurea, a Princesa chegou até a abrigar escravos foragidos em seu palácio. E, enquanto ficou na regência do Brasil, por três vezes, honrou o cargo.
Em carta datada em 11 de agosto de 1889 e apenas revelada em 2006, a princesa falava claramente do seu sonho em ver o Brasil indenizar os ex-escravos e distribuir terras para que eles pudessem sustentar-se por conta própria, ou seja, sonhava com uma reforma agrária! O melhor é que isso não era só um sonho, mas um projeto da monarquia já em fase de elaboração… E a princesa na mesma carta ainda defendia o voto das mulheres! Se levarmos em conta que a Nova Zelândia foi o 1º país no mundo a institucionalizar o sufrágio feminino em 1893, podemos perceber o pensamento avançado da princesa para a época. Porém, com o golpe de Estado de 15 de novembro de 1889, todos esses ideais foram frustrados. Nunca houve projeto republicano para os negros libertos nos moldes mencionados e as mulheres só passariam a votar em 1932… A Princesa Isabel, além de idealista, era ainda visionária em suas convicções religiosas, pois se correspondia com o Papa Pio IX solicitando a canonização do Padre José Anchieta – que só aconteceria em 2014 por decisão do Papa Francisco – e também com Dom Bosco, futuro santo italiano. Ela chegou a conhecer este último pessoalmente e o ajudou a construir um liceu salesiano em São Paulo para que os ex-escravos pudessem ter acesso à educação gratuita. Quanto mais eu estudo, mais eu me surpreendo com as atitudes da Princesa…
O assunto, como veem, é riquíssimo e eu poderia prolongar ainda mais este texto. Por ora, fico por aqui já com o gostinho de quero mais… Só afirmo que lerei o que eu puder sobre a Imperatriz Leopoldina e a Princesa Isabel; duas nobres que, apesar do pouco tempo no poder, fizeram muito pelo Brasil. Para comemorar este Dia Internacional da Mulher, presto minhas homenagens a essas duas grandes mulheres que escreveram páginas mais do que decisivas de nossa História.
Fontes Consultadas:
Imperatriz Leopoldina:
Artigo da BBC Brasil de em 10 de dezembro de 2017 : “Quem foi a primeira mulher a governar o Brasil”: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-42186974
Artigo do site da Casa Imperial do Brasil: Imperatriz Leopoldina
https://www.monarquia.org.br/imperatrizleopoldina.html
Revista de História da Biblioteca Nacional – Ano 9 – nº 107 – Agosto de 2014.
Princesa Isabel:
Artigo do site da Casa Imperial do Brasil: Princesa Isabel https://www.monarquia.org.br/princesaisabel.html
Revista de História da Biblioteca Nacional – Ano 7, nº 80, Maio 2012.
Nossa História – Ano 3, nº 31, Maio 2006 – Editora Vera Cruz.:
CARVALHO, J. Murilo. D. Pedro II. Perfis Brasileiros. Edição: 1. Companhia das Letras. 30 de abril de 2007. 296 páginas.
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