Faz quase um mês que a Rainha Elizabeth II nos deixou aos 96 anos e eu, que sempre a admirei muito, já estou sentindo falta de suas histórias, que eu acompanhava pela televisão e redes sociais. As emissoras de TV e a mídia em geral, tanto em nível nacional quanto internacional, deram grande destaque à partida da Rainha desta Terra e, por 11 dias, desde o dia 08 de setembro de 2022, o mundo acompanhou com atenção os documentários e as reportagens até o seu funeral no dia 19 que, pela reverência e beleza, fez jus à trajetória desta grande monarca. E um fato que me chamou a atenção foi que todas as pessoas de destaque que a conheceram pareciam ter um consenso sobre a personalidade da Rainha e usaram semelhantes expressões para classificar suas virtudes: senso de dever, devoção ao serviço, responsabilidade, respeitabilidade, dignidade, humildade, senso de humor… As qualidades não paravam por aí. O carisma, a determinação, a dedicação à família e às nações integrantes do Reino Unido e a da Commonwealth marcaram o mundo ao longo dos 70 anos de Reinado de Elizabeth II, o mais longo da história britânica e um dos mais amados e bem-documentados do planeta. Como resistir a um histórico assim?
A Rainha Elizabeth II já despertava a atenção e admiração do povo desde que ela era ainda uma jovem princesa aos 14 anos quando fez sua primeira transmissão radiofônica pela BBC dando suporte moral às crianças que estavam sofrendo nos tempos da II Guerra Mundial. Quando fez 18 anos foi a primeira mulher da família Real a servir nas Forças Armadas e ainda exerceu uma função considerada tipicamente masculina: dirigir e consertar ambulâncias. Ela viveu um dos momentos mais celebrados do século XX: a vitória dos países aliados no fim da II Guerra, em que seu país era só euforia e esperança. Casou-se aos 21 anos com o jovem tenente Phillip que não pertencia à nobreza – lindo, por sinal – e aos 26 já era monarca. Em 1953, ocorreu a cerimônia de sua coroação, a primeira a ser televisionada na História do Reino Unido. A partir de 1957 inaugurou a tradição de gravar uma esperançosa mensagem de Natal todos os anos para os seus súditos. Deste modo, Elizabeth II passou a ser cada vez mais popular e próxima do povo. Ao longo de seu reinado, teve quatro filhos, e seu casamento foi mais do que bem-sucedido: 73 de duração até a morte do Príncipe Phillip. O resto, como dizem habitualmente, é História.
Não podemos, entretanto, esquecer de momentos e características marcantes da soberana. Ela foi pioneira em diversos aspectos: além do já citado serviço prestado ao exército britânico, foi a mulher de seus país que mais realizou viagens, visitando bastante as nações amigas da Commonwealth e destacando-se em seus serviços diplomáticos. Era muito conhecida por seu amor aos animais, sobretudo os cachorros e cavalos, e também por sua discrição. Não dava entrevistas e tampouco comentava assuntos familiares ou políticos com a imprensa ou amigos, sobretudo os polêmicos. Assisti recentemente a um documentário em que o ex-Primeiro-Ministro Tony Blair disse que apreciava muito as conversas semanais que tinha com a Rainha, principalmente pela certeza de que ela não comentaria os assuntos dos encontros com ninguém. Ele disse que isso fazia com que os Primeiros-Ministros se sentissem à vontade e tivessem toda a confiança de falar o que pensavam com ela. A Rainha Elizabeth II procedeu sempre desta maneira com os seus Premiers, independente do partido. Tony Blair afirmou que ela estava “acima da política”. Não canso de imaginar os longos anos que ela viveu e o respeito que conquistou. Viu grandes transformações no mundo e sempre se manteve atualizada. Em 1965, reconheceu o talento revolucionário dos Beatles e os condecorou quando ainda não se tinha a ideia de por quanto tempo a influência do grupo musical duraria. Entregou a taça ao capitão da seleção inglesa em 1966 na única vez em que a Inglaterra venceu uma Copa do Mundo; pelo menos, até o presente momento. Viu a chegada do homem à Lua, conheceu inúmeros chefes de Estado, artistas, atletas, cientistas e cidadãos comuns. Foi testemunha de muitas tragédias como os bombardeios ao Palácio de Buckingham durante a II Guerra Mundial, escândalos familiares, entre eles de filhos e netos, o advento da Internet e as redes sociais, a pandemia do coronavírus. Mesmo nos tempos mais turbulentos comportava-se igualmente de modo elegante, gentil, firme e agradável como cabe a uma verdadeira Rainha. Transmitia estabilidade, segurança e empatia aos seus súditos em todo o mundo.
Uma coisa que também sempre admirei nela foi o seu empenho em estar a frente de projetos científicos e educacionais que ajudavam pessoas pobres em vários países. Estes, no entanto, sempre foram pouco comentados pela mídia. Lembro-me de certa vez que a Rainha participou de uma reunião online com jovens de países que estavam sendo contemplados com um projeto para a aprendizagem de informática patrocinado pela Coroa Britânica. Os jovens recebiam uma ajuda de custo e tiveram o prazer de apresentar à Rainha na videoconferência os trabalhos que eles estavam desenvolvendo. A Rainha Elizabeth mesmo depois dos 90 anos fazia questão de participar destes programas inovadores. E um outro trabalho marcante foi a sua atuação ao lado de sua nora, a Condessa de Wessex, em patrocinar programas de tratamento e prevenção à cegueira em alguns países como a Índia, Bangladesh e Malawi, inclusive ajudando a bebês a não desenvolverem esta doença. Os esforços da iniciativa ajudaram a reduzir as estatísticas de doenças graves da vista como o tracoma, causadora de cegueira infecciosa e é, segundo o site do Ministério da Saúde “um problema de saúde pública em muitos países em desenvolvimento e em áreas remotas de 43 países da África, Ásia, América Central e do Sul e Oriente Médio.” Graças a programas como este, muitas pessoas ficaram curadas, receberam cirurgias, voltaram a enxergar e bebês foram salvos de desenvolver a cegueira. Projetos maravilhosos assim tinham a Rainha como patrona e jamais cessaram. Sua preocupação com o próximo sempre foi uma constante em seu Reinado como se viu durante a pandemia: incentivando a população a se vacinar e tomar os cuidados necessários com a saúde. Mulher de fé cristã, em uma das suas mensagens de Natal afirmou: “Jesus é a âncora da minha vida”, e por esta âncora ela viveu toda a sua vida.
Se a trajetória da Rainha foi magistral, pude ver o reflexo disso foi no seu funeral. Nos dias que se seguiram à morte, filas imensas de pessoas se formaram para deixar seu tributo à monarca pela última vez. No dia do funeral, vi muito mais do que imaginava ser possível. Multidões se reuniram para ver o cortejo passar até a Abadia de Westminster e depois ao destino final, a Catedral do Castelo de Windsor. Viam-se muitas pessoas emocionadas, várias chorando, outras jogando flores, outras ávidas apenas para se despedir junto à fila dos militares, guardas reais, cavalarias, e a escolta oficial. Na Catedral de Westminster, a presença de nobres, chefes de Estado e representantes de mais de 100 países, líderes de diferentes religiões e todos os ex-primeiros-ministros britânicos ainda vivos, incluindo a atual Liz Trauss, recém-empossada pela Rainha, além dos amigos e membros da Família Real, quase todos trajando preto, de luto, em absoluto sinal de respeito. Quando o corpo da Rainha foi levado para o enterro em Windsor, a despedida final foi ao som de uma gaita-de-fole tocada de modo comovente por um escocês solitário em seus trajes típicos. Uma despedida grandiosa e à altura de uma mulher extraordinária, que cumpriu prontamente o seu papel de monarca fiel ao serviço de seu povo honrando os princípios e a instituição da Monarquia até o fim da vida.
Com certeza, este funeral foi organizado com tanto esmero, reverência e civilidade que superou todas as minhas expectativas. Para mim, fica difícil imaginar que não vou poder mais acompanhar os feitos da Rainha pela TV, Twitter ou Facebook. Perco a companhia longínqua da Rainha que, de certa forma, eu sentia tão próxima. E como ela tinha traços que lembram a minha mãe, eu a sentia ainda mais como uma figura familiar e maternal. Meu consolo é acreditar que ela sempre viveu e viverá em um reino: primeiro no Reino Unido aqui na Terra e agora junto de Deus no maior de todos os reinos: O Reino dos Céus! Consolida-se, assim, o que foi cantado com júbilo pelos britânicos durante 70 anos: “God Save the Queen!”*
*Obs.: Título do Hino britânico que significa: “Deus salve a Rainha!”, que agora será cantado como “God Save the King” em honra ao novo monarca, o Rei Charles III.
Fontes consultadas:
Isabel II do Reino Unido. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Isabel_II_do_Reino_Unido . Wikipedia.
A speech by The Countess of Wessex celebrating the work of The Queen Elizabeth Diamond Jubilee Trust.29 October 2019.Disponível em: https://www.royal.uk/speech-countess-wessex-celebrating-work-queen-elizabeth-diamond-jubilee-trust
Rainha Elizabeth II. Biografia. Disponível em: https://www.purepeople.com.br/famosos/rainha-elizabeth-ii_p1269
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